S. Sebastião, de Irene Lisboa
Este que é o último dia do mês Irene Lisboa em Arruda dos Vinhos (2017), deixamos este belíssimo poema desta escritora maior do séc. XX.
S. Sebastião!
Impudico.
Para quê esse gesto de dança, esses braços em
arco levantados?
E a garganta roliça, os olhos lânguidos descaídos...
Tão gracioso, tão nu, de faixa vermelha franjada...
Mas a descoberto as perfeitas cochas, de gordo
efebo! marchetadas de pequenas pérolas sangui-
neas, em fio...
À frente desta multidão ruça, meu S. Sebastião
de altar, destas mulheres embiocadas, destes ho-
mens soturnos, que figura fazes?
Elas cobertas de chita desgraciosa, eles de surro-
beco...
Caras vermelhuscas ou terrosas, pálidas...
Meu S. Sebastião deslaiado, de que és a imagem?
Do desconcerto, não?
Tão suculento e formoso, tão descansado!
Anda, baixa esses braços!
Cobre esse corpo e pega numa enxada.
Não ofendas os pobres.
Irene Lisboa
Outono havias de vir...